Uma arquitetura é feita de linhas. Retas. Planos traçados... É uma questão de destino. Eu aqui de cima: magnífica. Grande. Dura.
Daqui de cima eu vejo tudo. Os muros. A cidade. Luzes. Prédios. Ruas. Carros. Pessoas. Passam. Passam. As paredes. Buracos no chão.
As pessoas. Dentro de mim.
Algo acontece, escorre pelos canos.
Aqui dentro chove. Cheiro. Cheio de mulheres, mulheres...
Bucetas, bucetas, bucetas...
Dentro de uma
Arquitetura os corpos são conformados nos vazios. E nos cheios. Escrevem um texto que não conseguem ler. Nos corredores. Nas grades, nas celas. No pátio. No cimento. Nas veias. Túneis...
Dentro dela uma mulher esperava pegar dureza daquele lugar torto.
Águas escorrem pelas minhas veias, pingam. Escorre pelos canos.
Por dentro, estou carcomida. Você também. Somos cheias de segredos. Eu e você. Mas a semelhança acaba por aqui. Eu sou feita de areia. Cal. Estruturas metálicas. Nas minhas veias corre ferro.
Um fervilhar...
Corpos são conformados, se conformam nos vazios e nos cheios... Em mim escorre sangue, merda... Veias. Túneis... Eu sou a caixa de gordura da humanidade. Dentro dela uma mulher recitava:
Veias. Véias. Velhas.
Mulheres. Homens. Solidão... Ratos. Ratos. O cheiro daquela urina grudada na pele.
Quanto tempo até o chão? Quanto tempo até meu rosto tocar o chão vermelho?
A carne. Em direção à queda.
Eu grito e ninguém me escuta! Eu estou numa cela que faz parte de um andar que faz parte de um pavilhão que faz parte de uma cadeia de prédios que faz parte de um quarteirão que faz parte de um bairro que faz parte de um distrito que faz parte de uma cidade que faz parte de um estado que faz parte de um país... Eu grito e ninguém me ouve. Eu sou uma formiga. Eu sou uma formiga. Ninguém me escuta. A minha voz não tem som. Sou invisível. Ninguém me vê.
Do alto da torre, o olho passeia e eu invento um altar. Para o deus que fica lá, no alto da torre, vendo a vida passar. Na televisão. Na esquina do mundo. E eu aqui. Sentada nessa cela. Nesse tubo de ensaio. A gente só devia conhecer o que vive.
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