segunda-feira, 29 de novembro de 2010

mulheres de programa

hoje, 25 de novembro, fiz mais uma programa.
como sempre, não o fiz sozinha... que graça teria?
melhor seria dizer: nós o realizamos. 11 mulheres e um bendito fruto.


tornar real um programa é organizar um plano de risco e colocá-lo em ação. para desprogramar corpo e meio...

"mulheres painel em deriva pelo hipercentro de belo horizonte oferecem seus corpos para serem lidos. nestes, notícias de jornal se misturam a imagens de mulheres e a escritas improvisadas".




dando prosseguimento à investigação do feminino que a gente vem realizando (lica e eu), tínhamos proposto para as mulheres da marcha mundial das mulheres uma ação coletiva para o dia internacional da não violência contra a mulher. seria uma ótima ocasião para recolher mais imagens junto com anna e taynara, as moças da m.m.m. com quem estamos realizando uma parceria de trabalho para desenvolvimento de material audiovisual.
elas, para seu trabalho final na oi kabum. nós, para desenvolvimento de nossas questões.

a idéia era criar uma multiplicação, uma seriação de figuras femininas que, marcada por certas semelhanças - as mulheres teriam em comum os corpos/roupas de jornal - e circunscrita em uma determinada área, tenderia a provocar interrupções no fluxo cotidiano da cidade, um possível estranhamento.

com a necessidade das mulheres da marcha se concentrarem nas manifestações mais diretas e sem tempo hábil para prepará-las para a ação que pensávamos, acabamos por decidir convocar outras performers de belo horizonte que imaginávamos comungar em termos não só de linguagem, mas também de interesse temático ou de atitude política.
email, facebook e, em breve tempo, conseguimos um bom número de mulheres interessadas em realizar uma ação conosco.

como disse, fomos onze ao total. dessas, seis saíram, efetivamente, de mulheres painel: lica, letícia castilho, sílvia andrade, marcelle louzada, viviane (preciso saber seu sobrenome) e patrícia campos, pesquisadora que integra a rede colaborativa do obscena.
todas as outras (nina, marta, juliana, anna e taynara) e o bendito fruto, fernando, ficamos no necessário apoio: dentro de sala e no acompanhamento/registro na rua. afinal, temos que estar preparadas para tudo (também seria interessante saber o sobrenome de todas/o para os créditos nas fotos/imagens).

em evidente alusão a um tempo de guerrilhas, acabei por nomear a ação de ação performática 25 de novembro. letícia veio a caráter, vestida pra guerra. cada mulher painel construiu sua singularidade... silvia com seus sapatos de jornal e guarda-chuva, patrícia de "chanel", marcelle com sua cachorra e viviane de rainha... lica com sua mitra, aráutica...


nos corpos números de violência, bundas plastificadas e sorrisos cor de rosa. olhos roxos e palavras editadas. desprogramando. desprogramando. desprogramando.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

formas de morrer lentamente.

lipo.
aspiração mata.
mata sorrir. servir bem para servir sempre.
mata amar casar parir amamentar cuidar limpar. agradar. esquecer. perdoar.
transar. mesmo sem vontade.
o soutien. a calcinha de renda e o sexo oral nele como nunca nela (ela finge que não gosta para não ter que enfrentar sua cara de nojo).
o botox. o hidratante. o batom. o rosa. o rosa. o rosa. e o sorriso.
vai matando devagarinho. comendo a alma da gente. isso é o que me mata, sabe?

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Arquitetura III

Daqui de cima eu vejo tudo.
a cidade inteira.

luzes. prédios. ruas. carros. pessoas passam.

É uma questão de destino.
Uma arquitetura é feita de planos traçados. de linhas. retas. direções.
Uma arquitetura é Grande. Dura. Magnífica.
mas por dentro dela. de mim.
algo acontece.
(o interior carcomido)
uma arquitetura é feita de vazios. de cheios. é feita de passagens. de lugares vivências.
no interior pleno de mulheres algo sobe pelos muros. infiltra-se pelas paredes. escorre pelos canos. pelas velhas. veias. pelas coxas. cabelos. escorre das bucetas. bucetas. bucetas. sobem pelas paredes.
os corpos conformados nos vazios escrevem um texto que não conseguem ler.
Nos corredores. Nas grades, nas celas. No pátio. No cimento.
Na veia.
Dentro dela. de mim. uma mulher espera pegar a dureza daquele lugar torto.
Por dentro, estou carcomida e ela também. Somos cheias de segredos. Eu e ela. a mulher. O cheiro da urina grudada na pele.
Quanto tempo até o chão? Quanto tempo até seu rosto tocar o chão vermelho?
A carne. Em direção à queda.

Ela grita e ninguém escuta. Ela (eu) está numa cela que faz parte de um andar que faz parte de um pavilhão que faz parte de uma cadeia de prédios que faz parte de um quarteirão que faz parte de um bairro que faz parte de um distrito que faz parte de uma cidade que faz parte de um estado que faz parte de um país... Ela grita. eu grito. e ninguém escuta.

Do alto da torre, o olho passeia. eu invento um altar.
Para um deus possível que lá do alto da torre vê a vida passar.
Na televisão. Na esquina do mundo.
E eu (ela) aqui sentada. nessa cela. nessa sala. nesse tubo de ensaio.
A gente só devia conhecer o que vive.

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Arquitetura II

Daqui de cima eu vejo tudo.
a cidade inteira.
luzes. prédios. ruas. carros. pessoas passam.
É uma questão de destino.
Uma arquitetura é feita de planos traçados. de linhas. retas. de vazios. de cheios.
Uma arquitetura é feita de passagens. E de muros.
Uma arquitetura é magnífica. Grande. Dura.
mas por dentro dela.
de mim. (o interior cheio de mulheres)
algo acontece. escorre pelos canos. sobe pelas paredes. pelas coxas. cabelos. bucetas. bucetas.
pelas veias.
o cheiro. (o interior carcomido)
os corpos conformados nos vazios escrevem um texto que não conseguem ler.
Nos corredores. Nas grades, nas celas. No pátio. No cimento.
Na veia.
Dentro dela. de mim. uma mulher espera pegar dureza daquele lugar torto.
Por dentro, estou carcomida. Ela também. Somos cheias de segredos. Eu e ela. a mulher.
O cheiro da urina grudada na pele.
Quanto tempo até o chão? Quanto tempo até seu rosto tocar o chão vermelho?
A carne. Em direção à queda.

Ela grita e ninguém escuta. Ela (eu) está numa cela que faz parte de um andar que faz parte de um pavilhão que faz parte de uma cadeia de prédios que faz parte de um quarteirão que faz parte de um bairro que faz parte de um distrito que faz parte de uma cidade que faz parte de um estado que faz parte de um país... Ela grita. eu grito. e ninguém escuta.

Do alto da torre, o olho passeia. eu invento um altar.
Para um deus possível que lá do alto da torre vê a vida passar.
Na televisão. Na esquina do mundo.
E eu (ela) aqui sentada. nessa cela. nessa sala. nesse tubo de ensaio.
"A gente só devia conhecer o que vive".

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

importa se ela é mulher?

um dia após a eleição para presidência do brasil, me pergunto: importa se ela é mulher?
nesse dia histórico, em que pela primeira vez (após 35 homens governando o país) uma mulher alcança o posto de PRESIDENTA (assim, com A. os gêneros não são neutros), me pergunto: importa? mulher é uma condição política (como diria lennon, ela é o negro da humanidade).
disse há pouco: os gêneros não são neutros. o considerado neutro é, de fato, o gênero masculino.
ele nos é dado. como se dele viesse toda a criação, toda a eva. o masculino é visto como natural.
Homem (diz o aurélio). s.m. espécie humana, humanidade: a evolução social do homem. a criatura humana sob o ponto de vista moral: todo homem é passível de aperfeiçoamento. pessoa do sexo masculino. macho.
natural então é ter presidente, governador, prefeito, senador. estudante. médico. sargento. soldado. advogado.
engraçado, que mesmo quando é com a, é o masculino que conta. não falamos a poeta. tem que ser poetisa... o músico e a musicista (o feminino, aqui, só serve para a abstração: a palavra música jamais poderia ser colada a um corpo fêmea).
o natural é ser macho. fêmea é a dissidência.
então presidenta soa "feio", "cacofônico" (melhor falar a presidente, né? é mais natural...)
hoje, uma semana depois da experiência obscena com o cross-dressing proposto por leandro, me pergunto: existe neutralidade na discussão de gêneros? o que é ser mulher? homem? o que nos define? o sexo? o comportamento? as roupas, tons, gestos?
o que nos faz mulher?